De forma artística, Pedro Fernandes trata deficiência com humor e leveza
Empoderar significa conceder ou conseguir poder, também é lido no meio social como um processo de autoconhecimento onde um indivíduo o um grupo de pessoas se tornam conscientes das próprias qualidades, competências e uma potência antes adormecida, por conta de pré-conceitos estabelecidos socialmente ligados a aparência, fisicalidades, raça e diferenças de uma pessoa. Olhar para si e descobrir todas essas características é um poderoso amuleto responsável por quebrar padrões e abrir caminhos para os similares, e é assim que o ator petropolitano, Pedro Fernandes, de 33 anos, enxerga o novo desafio, vivenciando um personagem que aborda a naturalidade de corpos com deficiência (PCDs), na nova novela das 19h da Rede Globo, “Dona de Mim”.
O ator dá vida a Peter, filho do comerciante Manuel (ator – Ernani Moraes) e irmão de Danilo (Felipe Simas). Na trama, com humor e brincadeiras, ele trata do empoderamento da pessoa com deficiência, o personagem almeja furar a bolha do capacitismo, que começa muitas vezes na família, e se estende para o corpo social. “O Peter, está vencendo essa barreira dentro da família dele, com o intuito de viver a vida dele, de conseguir a autonomia para além do trabalho, quer vivenciar ela na parte social, amorosa e afetiva”, contou Pedro.
Pedro destacou que a narrativa gira em torno da independência, autonomia emocional e física da pessoa com deficiência. O que é algo novo na dramaturgia, já que geralmente a trama gira em torno de superação, sem explorar outros aspectos da vida. Além disso, a nova abordagem ressalta a presença dos corpos PCDs nos espaços de convívio, aguçando o olhar do outro sem estigmas e limitações. Para o ator, o papel representa um grande avanço na indústria audiovisual como um todo. “É importante para desmistificar a nossa capacidade, para mostrar que nós, atores com deficiência, também temos espaço, e o direito de fazer qualquer tipo de personagem, qualquer tipo de papel”, enfatizou.
Naturalizar corpos
Quebrar os tabus pode ser difícil, mas a arte atua nesse sentido, ela funciona como uma ferramenta de transformação social, já que, é o espelho da sociedade. Provocando-nos os espectadores empatia, indignação, senso de justiça, entre outros variados sentimentos. Nesse sentido Pedro Fernandes ressoa a importância de naturalizar diferentes corpos em todas as esferas artísticas, principalmente no audiovisual. “O texto da Rosane, com a direção do Alan, eles tratam essa naturalidade dentro da novela, e acho que vai ter um grande avanço no audiovisual, não só para mim enquanto artista, mas vai abrir portas para outros artistas PCDs. Espero que enxerguem a gente de uma forma diferente, com a sub-representatividade. Não dá mais para tolerar pessoas sem deficiência fazendo pessoas com deficiência. E não dá para ficar só nessa caixinha fazendo personagens PCDs. Podemos muito mais, fazer qualquer personagem que quisermos” disse.
O ator reforça a potência que há em ser quem é. “Nosso corpo existe e resiste. Pensa normalmente e pede passagem naturalmente. É um corpo presente. A importância desse espaço na TV é fundamental para que a gente possa avançar, não só artisticamente, mas como sociedade mesmo, para a gente naturalizar diferentes corpos nesse espaço e a gente enxergar a arte ampla como ela é e representativa como ela é”, ressaltou.
Novela
A experiência de Pedro está sendo transformadora, não só para ele, mas para toda estrutura, antes tão quadrada sem diversidade. “Muito tempo não tem uma novela tão representativa nessa diversidade de assuntos que a “Dona de Mim traz”. Então eu fico muito feliz de estar fazendo parte, de ser meio que pioneiro em a gente tratar a deficiência com humor, com leveza, com brincadeira, e também de uma forma pedagógica, ensinando muito ao público que está em casa, não só, mas também os atores que trabalham comigo, a equipe técnica. Todos me deixam super à vontade, está todo mundo unido nesse propósito de levar essa mensagem, que trata de temas tão importantes e tão urgentes na nossa sociedade” comentou.
Impulso
Pedro começou no teatro aos 14 anos de idade, de lá para cá se especializou no curso Instituto Técnico do Brasil, em Petrópolis, fez tablado da Maria Clara Machado, no Rio de Janeiro, com Milton Baez Pereira, entre outras formações. O último trabalho nos palcos, antes da tv, foi o espetáculo “Meu Corpo Está Aqui”, que trata de experiências sexuais de pessoas com deficiência. Tudo que envolve corpos e reflexão é o impulso de Pedro que vê a arte como um trampolim para a liberdade de narrativas. “O que me impulsiona é justamente isso. Você pode entrar na casa das pessoas e fazê-las refletir sobre diversos temas que não fazem parte da natureza delas. Então, acredito que a arte, como um todo, tem esse poder da reflexão, do debate. Estamos levando, debatendo diversos temas, assim como a naturalização do corpo da pessoa com deficiência numa novela da Rede Globo. Isso é essencial, é muito grandioso e importante esse espaço. Então, o que me motiva a continuar nesse fazer artístico, tanto nos outros trabalhos que eu fiz e nos que virão, é refletir, fazer as pessoas refletirem e se sentirem representadas e se sentirem tocadas pelo meu trabalho” indagou.
Foto: Arquivo pessoal/ Pedro Fernandes