A Defensoria Pública do Rio ajuizou, nesta sexta-feira, 1º, Ação Civil Pública cobrando do Estado do Rio, em caráter de urgência, medidas que assegurem a instalação e pleno funcionamento, em até 180 dias, da primeira Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (DEAM) naquele município da Região Serrana. O Dossiê Mulher aponta que, apenas em 2023, 2.848 mulheres foram vítimas de violência doméstica e familiar no município, a 9ª posição entre as cidades fluminenses que registraram mais casos desse tipo de crime.
A ACP, que vai tramitar na 4a Vara Cível de Petrópolis, requer que, em até trinta dias, o Estado apresente “plano detalhado e com cronograma” para a abertura da DEAM, “contendo a definição do imóvel, as etapas da obra ou adaptação, a previsão de lotação de pessoal (delegado/a, inspetores/as, escrivães/ãs e equipe multidisciplinar) e a aquisição de equipamentos.”
A petição inicial, assinada pela coordenadora do Núcleo Especial de Defesa dos Direitos da Mulher e de Vítimas de Violência de Gênero (Nudem), Defensora Thais dos Santos Lima, e pelo Defensor responsável pelo 8º Núcleo Regional de Tutela Coletiva (NRTC), Lucas Aparecido Alves Nunes, especifica que a unidade deve permanecer aberta 24 horas por dia, 7 dias por semana.
— Petrópolis, uma cidade com quase 300.000 habitantes, não possui uma Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher, sendo a única, entre as nove cidades com maiores números de violência, a não contar com este equipamento público essencial. As vítimas que buscam atendimento especializado são forçadas a se deslocar para municípios vizinhos, como Duque de Caxias ou Nova Friburgo, distante 50 km e 130 km, respectivamente — explica a Defensora Thaís dos Santos Lima.
Em comparação aos números do Dossiê Mulher de 2023, com dados de 2022, Petrópolis teve um aumento de 246 mulheres vítimas de violência doméstica e familiar, o que significa um crescimento de 9,45%””, destaca a ACP.
“A violência sexual passou de 147 vítimas para 172 vítimas, um aumento significativo de 17,01%. Esse incremento no número de vítimas da violência doméstica e familiar em Petrópolis já vem ocorrendo há alguns anos. De 2021 para 2022, o número de vítimas aumentou em 16,21%, quando o percentual de aumento superou os dados totais do Estado, que indicaram aumento de 15,15%.”
— A DEAM é a porta de entrada qualificada e indispensável para a rede de proteção, sendo o equipamento estatal primordial para assegurar que um pedido de socorro não se transforme em uma estatística de feminicídio. Portanto, a ausência de tais estruturas representa uma falha inescusável do poder público em seu dever constitucional de proteger a vida e garantir a segurança de suas cidadãs — ressalta o Defensor Lucas Nunes.
Dados preocupantes
Em 19 de maio último, audiência pública na Câmara Municipal de Petrópolis revelou “dados ainda mais preocupantes”, segundo a ACP. “Em 2024, a Polícia Militar atendeu a mais de 14.000 chamados relacionados à violência contra a mulher, um aumento significativo em relação ao ano anterior, que foi de 13.687 chamados. Segundo dados apresentados na mencionada audiência pública, entre janeiro e outubro de 2024, o município registrou 109 casos de estupro, o que representa um aumento de 24% em comparação ao mesmo período de 2023.”
Ainda com base em informações reunidas durante a audiência pública, a Defensoria salienta que “em 2024, foram feitos 420 registros de ocorrência por 400 mulheres na 105ª Delegacia Policial”, não especializada. E que apenas nos cinco primeiros meses de 2025, “já haviam sido registrados 170 ocorrências de violência doméstica na mesma delegacia, que funciona para atender todo tipo de ocorrência, sem equipe e condições específicas para assistência à mulher vítima. Na mesma audiência pública, aliás, mencionou-se que, de julho de 2022 a dezembro de 2024 foram registradas mais de 100 reclamações de mulheres sobre o atendimento policial pela delegacia de Petrópolis”.
— A inexistência de uma DEAM nega às mulheres petropolitanas e da região do entorno um atendimento policial especializado, sensível às dinâmicas da violência de gênero e capacitado para conduzir investigações adequadas. E tem um duplo efeito perverso: além de desencorajar a denúncia, revitimiza a mulher. Ao buscar ajuda em unidades não preparadas, a vítima frequentemente se depara com um atendimento que invalida seu sofrimento e destrói sua confiança no sistema de justiça — reforça a Defensora que coordena o Nudem.
O Defensor que atua no 8º NRTC complementa:
— A demanda é tão alta que, conforme a audiência realizada pela Câmara Municipal, o Centro de Referência de Atendimento à Mulher (CRAM) local realizou 1.876 atendimentos em 2024, uma média de mais de mais de 5 casos por dia.
Além dos pedidos de tutela antecipada de urgência para que o Estado apresente cronograma detalhado em trinta dias e instale e garanta o pleno funcionamento da DEAM de Petrópolis no prazo máximo de 180 dias, a Defensoria demanda na ACP a confirmação dessas medidas no mérito, além da condenação do Estado “ao pagamento de indenização por danos morais coletivos em valor não inferior a R$ 10.000.000,00 (dez milhões de reais), a ser revertido ao Fundo de Defesa de Direitos Difusos (art. 13 da Lei nº 7.347/85) ou a fundo estadual/municipal específico de proteção aos direitos da mulher”.
Na ACP, a Defensoria reitera que há legislação e compromissos internacionais firmados pelo Brasil assegurando o enfrentamento à violência contra a mulher, e que a Lei Estadual nº 9.605, de 22 de março de 2022, já “autoriza o Poder Executivo a implantar a Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher – DEAM no Município de Petrópolis”.