Em uma cultura saturada por imagens “perfeitas” nas redes sociais, a pressão para conquistar um corpo ideal cresce, e com ela, a frustração. Pesquisas internacionais associam a comparação social on-line ao aumento de insatisfação corporal e ao risco de transtornos alimentares, especialmente entre jovens que consomem conteúdos de “fitspiration”. Revisões científicas apontam que a comparação excessiva com imagens editadas ou filtradas está relacionada a maior preocupação com a aparência, baixa autoestima e sintomas de ansiedade e depressão. Há ainda registros do fenômeno conhecido como “dismorfia do Snapchat”, quando pessoas buscam cirurgias estéticas para se parecer com versões filtradas de si mesmas, comportamento que pode agravar quadros de transtorno dismórfico corporal.
Para o personal trainer e atleta de fisiculturismo Guilherme Lasmar, de 34 anos, carioca radicado em Petrópolis, a prioridade deve ser sempre respeitar a individualidade. Bacharel em Teologia e graduado em Educação Física, ele atua como treinador especializado em alta performance e já conquistou destaque no cenário competitivo da Classic Physique, tendo sido campeão em 2023 da National Physique Committee (NPC), maior federação mundial da modalidade. No entanto, apesar da própria trajetória de disciplina extrema, sua mensagem é clara: cada pessoa precisa buscar a melhor versão de si mesma, e não copiar o padrão do outro. “Cada corpo é um corpo. O outro pode até inspirar, mas nunca deve ser a sua meta, pois isso só causará frustração”, ressalta.
Lasmar observa que a individualidade biológica deve guiar qualquer plano de evolução física, levando em conta fatores como ossatura, proporções corporais, idade, histórico de saúde e até aspectos psicológicos. Para ele, o erro mais comum está em tentar replicar o treino ou a dieta de influenciadores ou atletas profissionais sem considerar o próprio estágio. “Respeite a sua etapa do processo; é assim que a evolução acontece”, explica.
A pressa por resultados imediatos também é apontada como um risco. Segundo o treinador, metas como perder 20 quilos em dois meses até podem ser alcançadas, mas jamais de forma saudável. Estudos de saúde pública indicam que perdas graduais, na ordem de meio a um quilo por semana, são mais sustentáveis e seguras, desde que acompanhadas por mudanças de rotina em alimentação, atividade física, sono e controle do estresse. “O papel do mentor é ajustar a expectativa, estabelecer a meta de longo prazo e criar mini-metas que mantenham a motivação”, diz.
Para ele, o verdadeiro corpo ideal não é aquele que replica celebridades ou atletas, mas sim o que traduz a melhor versão possível de cada pessoa dentro de seus próprios limites. Isso vale também para a rotina. Nem todos os dias o desempenho será o máximo, mas a disciplina em manter a constância faz a diferença. “No seu melhor treino você pode ter feito bíceps com 50 quilos; no dia ruim, com 20. Mas vinte sempre vão ganhar do zero daquele que desistiu. Eu sempre digo: qualquer coisa é melhor do que coisa nenhuma”, afirma.
O personal também defende que o papel da genética, embora relevante, não deve ser visto como fator determinante. Formas monogênicas de obesidade existem, mas representam uma parcela muito pequena da população. Para a ampla maioria, hábitos e ambiente são os principais motores de transformação. “Todos podem evoluir com um plano realista, consistente e supervisionado”, reforça.
Entre as estratégias que adota em seus atendimentos, Lasmar costuma solicitar uma foto de referência, não como espelho, mas como ponto de partida para alinhar expectativas. Ele explica que a ideia de “ser musculoso” varia enormemente: para um bodybuilder, pode significar 100 quilos com baixíssimo índice de gordura; para outro, basta a aparência de um ator de TV. “A referência ajuda a falar a mesma língua, mas a meta será sempre personalizada”, comenta.
Quando questionado sobre qual mensagem deixa para quem está começando, Lasmar resume em uma filosofia prática: começar de onde se está, sem esperar o momento perfeito, ter paciência com os resultados e cercar-se de pessoas que tragam motivação. Para ele, a mudança física é consequência de uma mudança de mentalidade. “Seu corpo vai aonde a sua mente alcança. Se a mente é limitada, o corpo nunca vai experimentar seu potencial máximo”, resume. E acrescenta: “Todo mundo começa de algum lugar. O importante é dar o primeiro passo, manter disciplina e aceitar que cada processo tem o seu tempo. Assim, o corpo ideal deixa de ser uma ilusão e passa a ser o reflexo da melhor versão de si mesmo.”.