A Justiça de Petrópolis determinou a suspensão imediata das obras e da comercialização das unidades do empreendimento Kastell Residencial, planejado para a Rua Olavo Bilac, na Castelânea. A decisão foi tomada pelo juiz Jorge Luiz Martins Alves, da 4ª Vara Cível, em ação movida pelo Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ), que apontou uma série de irregularidades ambientais e urbanísticas.
Segundo o processo, o empreendimento, que previa quatro blocos de oito pavimentos e 360 apartamentos, foi divulgado ao público em agosto, sem as licenças exigidas por lei. O local está em área classificada como Setor Residencial de baixa densidade, onde só são permitidas construções de até três andares, conforme o Plano Diretor e a Lei de Uso e Ocupação do Solo (LUPOS).
Decreto é anulado
Para viabilizar o projeto, a Prefeitura, ainda sob a gestão do ex-prefeito Rubens Bomtempo, editou o Decreto nº 1.169/2024, criando uma Área de Especial Interesse Social (AEIS) na região. No entanto, o magistrado considerou o ato ilegal, afirmando que mudanças no zoneamento urbano devem ser feitas por lei complementar aprovada pela Câmara de Vereadores, e não por decreto do Executivo.
Além disso, a Justiça concluiu que a justificativa usada para a criação da AEIS — atender famílias de baixa renda — era falsa. Documentos da Caixa Econômica Federal comprovaram que o empreendimento seria voltado às faixas 3 e 4 do programa Minha Casa Minha Vida, destinadas a famílias de classe média, e não à faixa 2, de renda mais baixa.
CPTrans não recebeu estudo de impacto viário
Durante a audiência especial, o presidente da CPTrans, Luciano Moreira, afirmou que não houve consulta prévia sobre o licenciamento do empreendimento e que faltam estudos obrigatórios de impacto viário e de vizinhança.
“Assim que a irregularidade foi constatada, a CPTrans solicitou a realização do estudo de impacto, mas até o momento não houve devolutiva oficial”, disse o dirigente.
O magistrado ressaltou que o Estudo de Impacto Viário (EIV) é essencial para analisar o tráfego e a capacidade da infraestrutura urbana, e que a ausência desse documento reforça o risco de colapso no trânsito da região.
Meio ambiente
O secretário de Meio Ambiente, Pedro Alcântara, declarou que nenhuma licença ambiental foi emitida para o empreendimento. Segundo ele, o processo de licenciamento ainda está em fase inicial de análise técnica e não há autorização para supressão de vegetação.
O chefe da APA Petrópolis, Victor Valente, confirmou que o projeto está em área de zona de ocupação residencial e urbana, mas alertou que o terreno contém fragmento de Mata Atlântica, cuja supressão ainda está em avaliação.
Já o INEA, por meio do biólogo Ramon Santiago, informou que não identificou obras em andamento nem corte de árvores durante vistoria realizada em agosto, mas reconheceu a existência de fragmento florestal nativo nos fundos do terreno.
Prefeitura confirma falhas em trâmites
O secretário de Planejamento e Orçamento, Frederico Procópio, reconheceu que a pasta revisa os processos de licenciamento herdados de gestões anteriores e destacou que todos os grandes empreendimentos deveriam ser submetidos a análise da CPTrans, DNIT e Ministério Público Federal.
O juiz considerou, no entanto, que o caos administrativo instalado nos setores de licenciamento reforça a necessidade de intervenção judicial.
Construtora nega irregularidades e diz que não iniciou obras
O empresário Rogério Luiz Gonçalves Branco, sócio da Genesis Incorporação e Empreendimentos Imobiliários, afirmou na audiência que nenhuma obra foi iniciada e que o evento realizado em agosto foi apenas um pré-lançamento para corretores.
“Apesar de já termos o alvará autorizativo para demolição das construções existentes no imóvel, ainda não o fizemos, nem tampouco iniciamos qualquer tipo de obra, bem como supressão de vegetação. O que ocorre periodicamente no imóvel é a limpeza e conservação com a retirada de matos, capinas e ajardinamentos, mantendo a propriedade em ordem, em estado de conservação”, disse o empresário.
A Caixa Econômica Federal, representada por Anderson Alves de Azevedo, esclareceu que o empreendimento ainda está em fase de pré-análise e não foi contratado pelo banco.
Decisão judicial
Diante das irregularidades, o juiz suspendeu o Decreto 1.169/2024 e determinou que as empresas parem imediatamente qualquer obra, venda ou divulgação do Kastell Residencial.
A sentença impõe multa de R$ 1,5 milhão para cada parte (construtora e Prefeitura) em caso de descumprimento e obriga as empresas a retirarem anúncios e propagandas do empreendimento das redes sociais e sites imobiliários.
A decisão também determina que as Secretarias de Planejamento e Meio Ambiente apresentem, em até 30 dias, um fluxo completo de procedimentos para emissão de licenças, a fim de garantir transparência e controle público.
“O quadro revela um cenário de intensa ilegalidade ante irresponsabilidade administrativa e oportunismo empresarial”, concluiu o magistrado.