O Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ) rejeitou o recurso dos ex-proprietários da conhecida “Casa da Morte”, localizada na Rua Arthur Barbosa, no bairro Caxambu, em Petrópolis, e manteve a decisão de desapropriação. A residência funcionava como um centro de tortura durante o período da ditadura militar brasileira, entre 1964 e 1985.
O veredito da Desembargadora, Maria da Penha Nobre Mauro, vai de acordo com a sentença da 4ª Vara Cível do município, que entendeu a necessidade de desapropriar o local e transformá-lo em um “Memorial da Liberdade, Verdade e Justiça”, devido ao histórico trágico de violação aos direitos humanos, simbolizando agora um exemplo do que não deve se repetir na história do país.
Recurso imposto
O recurso, alegou omissão, contradição e falta de fundamentação no pedido, além de outros pontos no que tange a indenização do município sobre o imóvel. “[…] Defendem o descumprimento do art. 10-A da Lei nº 13.867/19, que alterou o Decreto-Lei nº 3.365/41, e estabelece a obrigatoriedade de notificação prévia aos proprietários do imóvel, com oferta formal de indenização, antes da propositura da ação de desapropriação […]”, trecho da argumentação no acórdão.
Entendimento do TJRJ
Apesar da argumentação, a desembargadora reconheceu que o valor da indenização realizada pela Prefeitura Municipal, a fim de municipalizar o imóvel e transformá-lo em memorial, aconteceu de forma tardia, porém suficiente. “Em suma, o órgão judicial, para expressar a sua convicção, não precisa aduzir comentários sobre todos os argumentos levantados pelas partes. Sua fundamentação pode ser sucinta, pronunciando-se acerca do motivo que, por si só, achou suficiente para a composição do litígio”, parte do documento.
Entenda o processo
O processo de desapropriação e implementação do Memorial da Liberdade, Verdade e Justiça, começou em 2024, quando o Executivo municipal em conjunto com o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC) iniciaram as movimentações jurídicas.
A partir disso, o MDHC enviou para o município em forma de convênio cerca de R$1,4 milhões destinados ao fim. Com isso, em janeiro deste ano, a Prefeitura deu início ao processo de desapropriação, e em maio a Justiça concedeu ao órgão a posse da casa.
Na ocasião, a coordenadora-geral de Apoio a Políticas de Memória e Verdade do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, Paula Franco, destacou a importância do projeto, para o resguardo da memória e o combate à violação dos direitos humanos. “A transformação de um local de tamanha relevância histórica em um memorial representa mais um passo na construção de um amanhã pautado no fortalecimento da democracia e no compromisso com o que nunca mais deve se repetir”, enfatizou Paula.
Casa da Morte
O imóvel localizado no Caxambu, era um centro de tortura clandestino usado durante a ditadura militar. Segundo os registros históricos, ali eram realizados processos de tortura extrema e assassinatos de militantes e ativistas políticos, que iam contra o regime militar, lutando a favor do restabelecimento da democracia.
O número de militantes torturados e mortos no local não é preciso pois os acontecimentos registrados na casa da morte só foram expostos e revelados por uma sobrevivente, a ativista Inês Etienne Romeu, que era líder estudantil e dirigente da Vanguarda Popular Revolucionária (VPR).
Inês foi sequestrada por militares no dia 5 de maio de 1971 e levada ao Rio de Janeiro, no dia 8 foi trazida para Petrópolis. Em relato que consta no – Relatório Preliminar de Pesquisa sobre a “Casa da Morte de Petrópolis” da Comissão Nacional da Verdade, ela conta como foi.
“No dia seguinte, entre oito e nove horas, retiraram-me à força do Hospital e jogaram-me numa caminhonete C-14 que estava estacionada no pátio do Hospital. Deitada e com os olhos vendados, fui conduzida para uma casa que, com o decorrer do tempo, descobri situar-se em Petrópolis, e cujo telefone é quatro mil e noventa (creio ser uma extensão do telefone do vizinho, ao que parece o locador da casa; diariamente, este indivíduo a quem os agentes chamavam Mário, visitava o local e mantinha relações cordiais com os seus moradores”, trecho retirado do relatório da Comissão Nacional da Verdade.
Diante dos fatos, o Ministério e militantes reforçam a importância da criação do memorial, utilizado pela força de inteligência do Exército Brasileiro para violações aos direitos humanos.