Por Leandra Lima e Evelyn Carvalhaes
Na última semana, uma audiência emergencial para tratar da atual situação do Hospital Alcides Carneiro (HAC), na 4ª Vara Cível de Petrópolis, expôs a vulnerabilidade do sistema municipal de saúde para com a gestão de grandes hospitais. Na ocasião, foi identificado que o Alcides, que é gerido pelo Serviço Autônomo do Hospital Alcides Carneiro (Sehac), está enfrentando uma crise devido aos atrasos dos repasses da Prefeitura, o que continua alargando a dívida herdada de gestões passadas.
A pendência financeira do município com o Sehac vem desde 2019. Na época, o montante era de mais de R$ 39 milhões. O valor continuou crescendo: em 2020 passou para aproximadamente R$ 44 milhões; em 2021 foi para R$ 45 milhões; em 2022, chegou a quase R$ 54 milhões. Já em 2023 caiu para R$ 5 milhões e aumentou em 2024, registrando R$ 17 milhões.
Atualmente, até julho de 2025, os números chegavam a quase R$ 36,7 milhões. Porém, segundo o Sehac, após o abatimento de impostos extintos em notas fiscais de 2017 a 2023, a dívida da Prefeitura hoje é de pouco mais de R$ 118 milhões.
Diante do juízo, o secretário de Saúde, Luiz Cruzick, disse que repassaria, ainda na última semana, aproximadamente R$ 1 milhão, para ser descontado da dívida.
Crise
O fator gera diversas dificuldades para a unidade. Na audiência, representantes do Sehac informaram sobre a carência de insumos básicos e medicamentos, além da suspensão e reagendamento de cirurgias, que vêm acontecendo com frequência. Segundo o panorama, a situação tem afetado diretamente pacientes oncológicos e as cirurgias gerais, especialmente de vesícula e urologia, que representam a maior demanda.
O cenário descrito já aconteceu ainda este ano. Em outra audiência, realizada em setembro, a diretora do Hospital Alcides Carneiro, Ronye de Lourdes Pinheiro, mencionou que, em abril deste ano, houve uma paralisação de dois dias no serviço de cirurgia de urologia.
Insumos
Em relação aos insumos hospitalares — que vão de equipamentos de proteção para os profissionais, itens de curativo, seringas, higiene, entre outros —, Gilberto de Melo Pires, gerente de suprimentos do almoxarifado, informou que o estado é crítico. Cerca de 42 itens estavam faltando; desses, 20 foram supridos, e mais da metade segue em falta. Gilberto destacou que os pedidos de reposição são sempre encaminhados à diretoria do hospital.
Medicamentos
A responsável pelo abastecimento farmacêutico do hospital, Marcela Monteiro, relatou que o setor enfrenta falta de medicamentos considerados essenciais, com dezoito itens zerados no estoque — entre eles, o anti-hipertensivo carvedilol 12,5 mg, medicamento usado para tratar insuficiência cardíaca e hipertensão arterial, em falta há cerca de trinta dias.
O fato também já se repetiu outras vezes: em abril, faltaram antibióticos.
Nutrição
Outro ponto que chamou atenção foi a questão nutricional. Para conter gastos, profissionais também foram orientados pela direção do Sehac a reavaliarem o cardápio das refeições, priorizando a redução de custos sem comprometer o valor nutricional. Conforme o relato da nutricionista Vanessa Wendling, hoje o item mais caro do cardápio é a proteína, que está sendo substituída — a carne vermelha pela branca, como frango e ovo.
Desrespeito
Frente ao exposto, o juiz Jorge Luis Martins apontou que a situação é um desrespeito aos princípios administrativos e constitucionais, ressaltando que a Prefeitura deve cumprir com o papel de repassar os subsídios necessários para a unidade.
Mesma situação
Outros hospitais conveniados com o município de Petrópolis também têm um histórico de distúrbios nos setores por falta de repasse. Um exemplo é o Hospital Santa Teresa (HST), que cogitou cortar o convênio SUS entre a unidade e o município devido às dívidas.
Em fevereiro deste ano, foi realizada uma audiência na 4ª Vara Cível para discutir os débitos, que eram de cerca de R$ 16 milhões — herança da gestão do ex-prefeito Rubens Bomtempo. Desse montante, o atual governo informou que pagou pouco mais de R$ 1 milhão e 700 mil.
Apesar do ocorrido, no mês de abril, a Prefeitura e o HST apresentaram à Justiça uma proposta de renovação do convênio entre as partes por mais 24 meses. O documento previa o pagamento parcelado da dívida, que, após alguns abatimentos, se encontrava em R$ 14 milhões.
Outro que vem sofrendo com pendências é o Hospital das Clínicas de Corrêas (HCC). Em setembro, foi realizada uma audiência pública na Câmara Legislativa para discutir os atendimentos na unidade. Durante a sessão, representantes do HCC informaram que a dívida do município era de R$ 26 milhões.